Do Piso Salarial dos Cirurgiões-Dentistas – Da (im)possibilidade de
aplicação da Lei Federal n.o 3.999/61 para os servidores públicos
municipais e estaduais

Essa matéria, de aplicação da Lei Federal n.º 3.999/61, que estabelece o piso salarial de cirurgiões-dentistas e médicos, ainda demandará bastante enfrentamento nas Cortes Superiores, até a devida pacificação de entendimento. 

No entanto, é preciso ressaltar a decisão datada de 28/10/2021, do Supremo Tribunal Federal, o qual julgou o Recurso Extraordinário de n.º 1.340.676/PB, de relatoria do Exmo. Sr. Dr. Ministro Ricardo Lewandowski.

Restou devidamente claro que cabe à União a regulamentação das condições para o exercício profissional.

Ou seja, como a Lei n.º 3.999/61 é federal e trata de questões relacionadas à carga horária – jornada de trabalho – e valores mínimos de remuneração, cabe aos demais entes, Município e Estado, apenas respeitar a lei. Tanto que assim restou a decisão, a saber um pequeno trecho que aqui se refere: “No caso em questão, a Lei Federal 3.361/1961, que estabeleceu o piso salarial de acordo com jornada de 20 horas de trabalho para médicos e cirurgiões dentistas, deve ser observada por todos os entes federativos, aplicando-se, portanto, aos servidores municipais.”

E no mesmo sentido está a decisão da Exma. Sra. Dra. Ministra Rosa Weber, proferida em 03/12/2021, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.357.537/PR. 

Assim, num primeiro momento, o Supremo Tribunal Federal entende que sim, deve o piso salarial disposto na Lei Federal n.º 3.999/61 ser aplicado aos servidores públicos.

No início desse artigo foi abordado que ainda haverá enfrentamento nas Cortes Superiores em razão de ser uma lei publicada há mais de sessenta anos, pois data de 15/12/1961. Não há dúvida de que a lei foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Ou melhor, é compatível com a nossa Constituição. Assim, deve a lei ser respeitada e aplicada. Ocorre que os municípios e estados, administrativamente, não observam a lei federal em razão da interpretação e aplicação do art. 4º, que traz a expressão: “com a relação de emprego”.

Sem maiores aprofundamentos, a relação de emprego é uma espécie de relação de trabalho. De um lado está o empregador e de outro o empregado, existindo uma relação contratual, ainda que não escrita, aplicando-se a Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT.

Quando há controvérsia envolvendo a CLT, em regra a competência para julgar o caso é da Justiça do Trabalho.
Mas, sobre os servidores públicos, como ensina o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, a relação jurídica entre o Poder Público e os servidores é estatutária, institucional.

Há leis próprias no âmbito federal, estadual e municipal, quais sejam os “regimes jurídicos únicos” – RJU’s. Então, é possível o entendimento de que a Lei Federal n.º 3.999/61, ainda, viola o pacto federativo e a autonomia dos estados e municípios em fixar o RJU e o plano de carreira e vencimentos de seus servidores.

É em razão de tais fundamentos, ou melhor, argumentos, que os municípios e estados deixam de respeitar a lei federal. E com há, sempre, muita discussão sobre orçamentos e gastos públicos, eventual aplicação da Lei geraria o aumento despesas, seja para a folha mensal atual e orçamento anual, seja para o “passivo”, pois teria de reparar/indenizar os servidores que deixaram de receber o piso nos últimos cinco anos.

Para os cofres públicos é uma grande consequência. Aqueles servidores que já estão nos cargos e não receberam suas remunerações com observância da Lei 3.999/61, poderiam, eventualmente, cobrar os últimos cinco anos sobre aquilo que deixaram de perceber, tanto sobre o vencimento básico quanto sobre as demais vantagens (insalubridade, anuênios, etc.) calculadas sobre o vencimento.

E há possibilidade da justiça comum estadual, local de tramitação das ações de servidores públicos municipais e estaduais, entender pela inaplicabilidade da Lei Federal 3.999/61. Fala-se isso porque as decisões do STF, aqui já citadas, não geraram força vinculante, a qual obriga aos demais Tribunais.

Assim como chegou ao Supremo Tribunal Federal o caso do piso salarial dos agentes comunitários de saúde e dos agentes de combate a endemias – Tema 1.132 – em que a discussão paira se a lei federal dos agentes é aplicada aos entes municipais e estaduais, esse tema da Lei do Piso dos médicos e cirurgiões-dentistas também possui provável julgamento pela Corte Máxima a fim de pacificar, de vez, a matéria.

Portanto, é preciso muita cautela no trato da questão, por todos, tanto pelos servidores quanto pelos entes públicos.


Santa Maria-RS, 03 de fevereiro de 2022.

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